domingo, 24 de julho de 2005

Amor eterno de Pedro e Inês no CAE

“Inês, Inês”. O clamor, inquieto, de D. Pedro profetizava a morte trágica da bela dama da corte a castelhana Inês de Castro, com quem o príncipe mantinha uma relação amorosa, que acabou numa tragédia de sangue.

A história é, no ano em que se comemoram 650 anos sobre a morte de Inês de Castro, o mote para o bailado sobre a mais universal das tragédias de amor portuguesas, “Pedro e Inês”, pela Companhia Nacional de Bailado.

A dança com coreografia de Olga Roriz subiu anteontem ao palco do grande auditório do Centro de Artes e Espectáculos (CAE) da Figueira da Foz. Mais do que uma história de um casal apaixonado que desafiou adversidades, “Pedro e Inês”, é uma das provas de que o amor é imortal, como se do alimento da vida se tratasse. “Foi um desafio muito grande e fascinante trabalhar neste projecto” afirmou Olga Roriz.

Para Mário Vieira de Carvalho, secretário de Estado da Cultura, este é um bailado “excelente no momento em que se comemora o ano Inesiano”.

A história, que atravessa intacta as gerações, desenrola-se no século XIV. Pedro e Inês não são figuras imaginárias. O casal mediaval realmente existiu. Em palco, e ao longo da cena, dois casais de bailarinos marcam as diferentes fases da vida do par, num espectáculo de hora e meia.

Uma piscina representa a Quinta das Lágrimas, em Coimbra, local onde os amantes se entregavam frequentemente à paixão. Local também fatal, pois foi onde D. Inês foi barbaramente assassinada, degolada pelos punhais de três fidalgos estrangeiros. O sangue derramado pela castelhana deu um tom avermelhado às pedras da mítica fonte. No bailado, rosas vermelhas espalhadas pela água simbolizam o sangue derramado.

D. Pedro, “O Justiceiro”, possesso de ódio, vingou-se dos assassinos da sua amada, torturando-os, sem misericórdia. Ao fidalgo Álvaro Gonçalves, Pedro arrancou-lhe o coração pelas costas. O momento da vingança é um dos mais fortes do bailado. A música de John Zorn e Einstürzende Neubauten reforçam o rigor técnico dos bailarinos.

Já na recta final do bailado assiste-se à “Coroação da Rainha”. D. Pedro, então já rei de Portugal, mandou exumar a ossada de D. Inês e coroou-a rainha de Portugal. Uma cerimónia tão patética, como o amor obsessivo se pode transformar.

Na coroação, D. Pedro ordenou aos presentes que ajoelhassem diante do cadáver e beijassem a mão. O povo, representado por uma dezena de bailarinos, chora pela a rainha morta. Pedro, à beira da loucura, jura amor eterno a Inês. “Até ao fim do mundo” lê-se no túmulo da castelhana, sepultada em Alcobaça, junto a D. Pedro.

nOTA DE rODAPÉ: Esta era a minha peça escrita para o JN sobre o bailado "Pedro e Inês" que, sexta-feira à noite, esteve no CAE.

1 comentário:

Acácio Simões disse...

Até ao fim do mundo



Era pedra e sobre essa pedra

Ergueu-se o templo do amor atroz.

Ele de fogo, ela a cordeira

Toda cordura chamando o algoz.



Songram as tubas: Inês é morta!

Em meigo muito transmuta-a o pranto

Do ermo amante que erra sozinho

No seu deserto de diamante.



Nem ar sangrento buscam seus olhos

Do corpo amado desfeitas pérolas;

E como fera coro os ossos

Da formosura que ao alto o espera



E em desatino da paixão lusa,

Perdida a alma que em Inês tinha,

O fim do mundo ficou esperando

Aos pés da morta, sua rainha.



Natália Correia, Até ao fim do Mundo