“Inês, Inês”. O clamor, inquieto, de D. Pedro profetizava a morte trágica da bela dama da corte a castelhana Inês de Castro, com quem o príncipe mantinha uma relação amorosa, que acabou numa tragédia de sangue.
A história é, no ano em que se comemoram 650 anos sobre a morte de Inês de Castro, o mote para o bailado sobre a mais universal das tragédias de amor portuguesas, “Pedro e Inês”, pela Companhia Nacional de Bailado.
A dança com coreografia de Olga Roriz subiu anteontem ao palco do grande auditório do Centro de Artes e Espectáculos (CAE) da Figueira da Foz. Mais do que uma história de um casal apaixonado que desafiou adversidades, “Pedro e Inês”, é uma das provas de que o amor é imortal, como se do alimento da vida se tratasse. “Foi um desafio muito grande e fascinante trabalhar neste projecto” afirmou Olga Roriz.
Para Mário Vieira de Carvalho, secretário de Estado da Cultura, este é um bailado “excelente no momento em que se comemora o ano Inesiano”.
A história, que atravessa intacta as gerações, desenrola-se no século XIV. Pedro e Inês não são figuras imaginárias. O casal mediaval realmente existiu. Em palco, e ao longo da cena, dois casais de bailarinos marcam as diferentes fases da vida do par, num espectáculo de hora e meia.
Uma piscina representa a Quinta das Lágrimas, em Coimbra, local onde os amantes se entregavam frequentemente à paixão. Local também fatal, pois foi onde D. Inês foi barbaramente assassinada, degolada pelos punhais de três fidalgos estrangeiros. O sangue derramado pela castelhana deu um tom avermelhado às pedras da mítica fonte. No bailado, rosas vermelhas espalhadas pela água simbolizam o sangue derramado.
D. Pedro, “O Justiceiro”, possesso de ódio, vingou-se dos assassinos da sua amada, torturando-os, sem misericórdia. Ao fidalgo Álvaro Gonçalves, Pedro arrancou-lhe o coração pelas costas. O momento da vingança é um dos mais fortes do bailado. A música de John Zorn e Einstürzende Neubauten reforçam o rigor técnico dos bailarinos.
Já na recta final do bailado assiste-se à “Coroação da Rainha”. D. Pedro, então já rei de Portugal, mandou exumar a ossada de D. Inês e coroou-a rainha de Portugal. Uma cerimónia tão patética, como o amor obsessivo se pode transformar.
Na coroação, D. Pedro ordenou aos presentes que ajoelhassem diante do cadáver e beijassem a mão. O povo, representado por uma dezena de bailarinos, chora pela a rainha morta. Pedro, à beira da loucura, jura amor eterno a Inês. “Até ao fim do mundo” lê-se no túmulo da castelhana, sepultada em Alcobaça, junto a D. Pedro.
nOTA DE rODAPÉ: Esta era a minha peça escrita para o JN sobre o bailado "Pedro e Inês" que, sexta-feira à noite, esteve no CAE.
1 comentário:
Até ao fim do mundo
Era pedra e sobre essa pedra
Ergueu-se o templo do amor atroz.
Ele de fogo, ela a cordeira
Toda cordura chamando o algoz.
Songram as tubas: Inês é morta!
Em meigo muito transmuta-a o pranto
Do ermo amante que erra sozinho
No seu deserto de diamante.
Nem ar sangrento buscam seus olhos
Do corpo amado desfeitas pérolas;
E como fera coro os ossos
Da formosura que ao alto o espera
E em desatino da paixão lusa,
Perdida a alma que em Inês tinha,
O fim do mundo ficou esperando
Aos pés da morta, sua rainha.
Natália Correia, Até ao fim do Mundo
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